terça-feira, 13 de abril de 2010

Circular de Cordão: O Grande MITO!!!

Compartilho com vocês um texto maravilhoso de um médico obstetra também maravilhoso: Dr. Ricardo Jones. Neste texto ele comenta como as famosas Ciculares de Cordão não passam de um grande mito, mas que ainda levam a inúmeras cesáreas desnecessárias em nosso país. Deleitem-se com esta reflexão leve, agradável e muito profunda.


"Circular de Cordão"
(Dr. Ricardo Herbert Jones)

"Minha experiência com circulares de cordão é razoável. Muitas pacientes me procuravam com medo de uma cesariana porque o seu médico falava que o cordão esta enrolado no pescoço, portanto uma cesariana era mandatária, sob pena do nenê entrar em sofrimento.

Circulares de cordão são banalidades na nossa espécie. Um número muitogrande de crianças nasce assim. Eu tinha a informação que a incidência erade 30%, mas talvez seja um número antigo ou inadequado. De qualquer sorte,uma quantia considerável de crianças vem ao mundo desta forma. Já tivepartos com 3 voltas bem firmes no pescoço, e com apgar 9/10.

É engraçado ver a expressão das pacientes quando conto pra elas que o que me preocupa não é o pescoço, mas o cordão. O fato do pescoço estar sendopressionado é pouco importante se comparado com a compressão do cordão. A fantasia da imensa maioria das mulheres (mas também dos homens) é que a criança está se ""enforcando"" no cordão. Elas ficam surpresas quandoexplico que o bebê não está respirando, então porque o medo da asfixia? Acontece que existe espaço suficiente para o sangue transitar pela estruturado cordão, protegida pela geléia de Warthon que o recobre, mesmo com voltasem torno do pescocinho. Além disso, se houver uma diminuição na taxa depassagem de oxigênio pelo cordão isso será percebido pela avaliação intermitente durante o trabalho de parto. E esse evento NUNCA é abrupto. DIPs de cordão, como os chamamos, ficam dando avisos durante horas, e são diminuições fortes apenas durante as contrações, com o retorno para umbatimento normal logo após. Marcar uma cesariana por um cordão enrolado no pescoço é um erro.

Sei como é simples e fácil apavorar uma mãe fragilizada contando histórias macabras a esse respeito, mas a verdade é que não se justifica nenhuma conduta intervencionista em virtude deste achado. Por outro lado, a presença deste diagnóstico tão disseminado nos consultórios e nas conversas entre pacientes nos chama a atenção porque, se não é um problema médico, é uma questão sociológica.

Esse exame parece funcionar como um acordo subliminar entre dois personagensescondidos no inconsciente dos participantes da trama, médico e paciente.

De um lado temos uma paciente amedrontada, desempoderada diante de uma tarefa que parece ser muito maior do que ela. Acredita piamente no que o""representante do patriarcado"" (no dizer de Max) lhe diz. Não retruca, não critica; sequer pergunta. Nada sabe, mas precisa do auxílio daquele que detém um saber fundamental aos seus olhos. Diante das incertezas, da culpa,do medo e da angústia ela se entrega, aliena-se. Fecha os olhos e coloca o"anel", que faz com que ela mesma desapareça, entregando-se docilmente aos desígnios dos que detém o poder sobre seu destino. Oferece seu corpo paraque dele se faça o que for necessário.

Na outra ponta está o médico. Sofre em silêncio a dor da sua incapacidade.Pensa baixinho para que ninguém leia seus pensamentos. Sabe que pouco sabe,mas também tem plena noção do valor cultural que desempenha. Nada entende domilagre do nascimento, mas percebe seus rituais, muitas vezes ridículos,outras vezes absurdos e perigosos, produzem uma espécie de tranquilização nas mulheres. Não se encoraja a parar de encenar, porque teme que não lhe entendam. Continua então repetindo mentiras, esperando que não descubram o quão falsas e frágeis elas são. É muitas vezes tomado pelo ""pânico consciencial"", que é o medo diante de uma tomada de consciência. Muitas vezes age como um sacerdote primitivo que, por uma iluminação divina ou por conhecimento adquirido, percebeu que suas rezas e ritos de nada influenciamas colheitas, e que o que governa estes fenômenos está muito além de suas capacidades. Entretanto, sabe que os nativos precisam dos rituais, que elepercebe agora como inúteis, porque assim se dissemina a confiança e a esperança. Mente, mas de uma forma tão brilhante, sofisticada e tecnológica,que deveras acredita no engodo que produz.

Ambos, mulher e médico, precisam aliviar suas angústias diante de algo poderoso, imprevisível e incontrolável. Olham-se e tramam o golpe. O plano que deixará ambos aliviados diante do enfrentamento. Mentem-se comos olhos. Eu finjo saber; você finge acreditar. Peço os exames. Todos. E mais um pouco. Procuro até encontrar aquilo que nos fornecerá a chave. A minúscula desculpa. Eu, com ela nas mãos, posso realizar os rituais que medesafogam da necessidade de suportar a angústia de olhar e nada fazer. Você,poderá escapar da dor de aguardar e fazer o trabalho por si. Poderá dizerque ""tentou"", mas, foi melhor assim. O nenê poderia correr perigo. Ocordão poderia deixar meu filho com problemas mentais, etc.

Feito. Pedido o exame, lá estava: O cordão, mas poderia ser o líquido, aposição, a placenta, a ossatura, as parafusetas protodiastólicas. Quem se importa? O carneiro, a virgem, o milho, todos são sacrificados. Quem seimporta? Livramo-nos da dor. Anestesiamos nossas fragilidades e angústias. Ritualizamos, encenamos e todos acreditam. Nem todos! Alguns acordam, mesmo que leve muito, muito tempo. "

Dr. Ricardo Herbert Jones
Médico obstetra e homeopata
Porto Alegre - RS.

2 comentários:

  1. muito interessante ,mais sei que pelo ao menos algum risco pode correr ;você faria um parto do seu filho normal se ele estivesse nesse caso????????;tem certeza que arriscaria ter sofrimento fetal ou não?!!!!!!!!!!!!

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  2. Excelente texto, Dr. Ricardo! Por favor, continue escrevendo e informando...

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