domingo, 15 de março de 2009

Relato de Parto

Abaixo compartilho com vocês um depoimento de parto recém vivenciado. É lindo!!!! E além dessa beleza poética, é uma demonstração de força e superação de limites e de cultura arraigada.
Postado na comunidade VBAC no Orkut:
"Catarina e o sonho de um HBAC (Parto em casa após cesárea - Em 10/03/09) Amarelei. Arreguei. Pedi analgesia. Pedi cesárea. Chamei pela minha mãe. Falei que não queria mais brincar disso. Tava doeeeeendo!! Mas ao mesmo tempo eu repetia como um mantra: Eu vou conseguir... Eu vou conseguir. Eu VOU conseguir! Eu VOU CONSEGUIR! EU CONSIGO!! Fechava os olhos e lembrava de todos que me apoiaram. E de todos que, mesmo secretamente, torciam contra mim. Abria os olhos e via diante de mim três anjos que me falavam como eu estava indo bem, que faltava pouco, que agora estava cada vez mais perto, que eu era forte, que eu era guerreira. Guerreira? Eu me sentia uma farsa, uma traidora... Porque estavam todos ali me apoiando e eu pensando em como eu ia pedir para o Dr. Fred, assim que ele chegasse, pra me levar pro hospital e terminar com tudo. Mas isso eu não falei. E me apoiava nessas pessoas que, naquele momento eram toda a força que eu tinha. Allan, Clarissa e Rafaela. Se não fossem vocês eu não tinha conseguido. E eu dedico esse relato a vocês. Tudo começou às 03:30 da madrugada do dia 10. Contrações espaçadas, com um intervalo médio de 30 min, pouco doloridas. Levantei. Comi um sanduíche. Tomei suco. Pensando bem... Tudo começou às 17:30 do dia 09, quando a Rafaela, no consultório, espetou umas agulhas para começar a indução. Eu tinha completado 40 semanas na véspera, e agora o tempo estava contra mim. Com uma cesárea prévia recente, de 20 meses, estava fora de questão ser induzida com soro. Ou eu entrava em trabalho de parto, ou eu entrava. Saí do consultório normal. Não senti nada de diferente. Mas de madrugada a coisa começou a acontecer. Às 05:30 consegui me deitar novamente e cochilei entre as contrações por mais umas 2 horinhas. Allan foi levar o Rafa pra creche e voltou. Falei pra ele não ir trabalhar e ficar comigo. Ele ficou. Às 09:00 liguei pra Clarissa, as contrações estavam irregulares, começando a ficar doloridas, mas variavam desde 20 minutos entre uma e outra até 4 minutos entre elas!! Ela pediu pra eu anotar todas e me ligou às 10:00. Os intervalos maiores tinham baixado pra 10 minutos, mas ainda estavam irregulares. Eu tinha consulta com o Dr. Fred às 11:30, então combinamos que eu ligaria após a consulta e ela viria aqui pra casa ficar comigo. Tomei um copo de suco antes de sair de casa. Na sala de espera do consultório tive umas 3 ou 4 contrações das boas, ele atrasou um pouco pra me atender e só entrei meio-dia. Entre uma contração e outra fomos conversando. Só de olhar ele já disse: é, são contrações mesmo. Fui fazer o toque. Ele esperou uma contração passar e fez. Surpresa!! Colo do útero centralizado, longo, sem dilatação!! Como assim?? Mas como eu estava tendo contrações, a perspectiva é que eu começasse a dilatar em breve. A essa altura, estavam mais regulares, de 8 em 8 minutos. E o Dr. Fred falou que eu DEVERIA estar com pelo menos uns 3 cm. Combinamos então que ele viria aqui em casa às 16:00 para me reavaliar. Fui pra casa, cochilando entre uma contração e outra no carro. Liguei pra Rafaela e combinei dela ir lá em casa, eu tinha uma consulta com ela pra induzir às 14:00 e resolvemos mudar os planos, ela ia dar uma aliviada na dor com as agulhas. Chegamos e a Clarissa já estava esperando. Foi um alívio vê-la, pois eu estava desnorteada com a falta de dilatação. Assim que entramos, me deu uma ânsia de vômito e lá se foi o suco e o sanduíche da madrugada. Allan almoçou, mas eu não conseguia nem olhar pra comida. Tive também um pouco de diarréia. Fui pro chuveiro, na banqueta de parto. A água morninha aliviou um pouco a dor. Depois me deitei. A Rafaela chegou e começou a me espetar. Não sei dizer se ajudou ou não. Depois fui pra sala, ficar um pouco na bola. A cada contração eu ouvia a Clarissa falando pra eu não lutar contra a contração, pra eu deixar ela vir. Às vezes dava um desespero, eu esquecia de respirar. Fundamental ela estar lá pra me lembrar do que fazer e do que não fazer. Eu tinha que relaxar, saber que a contração tinha um pico de dor, e que a dor diminuía e depois dava tempo até de descansar para a próxima. Teve um momento que ela me garantiu que a dor não seria maior que aquela. Era tipo uma dor de cólica menstrual, realmente era suportável. Perguntei incrédula: “Não vai aumentar a intensidade?” E ela: “Não. Só vai ficar mais freqüente.” Eu repeti tentando internalizar a informação: “Mesma dor. Mais vezes. Acho que agüento.” Mas dá um desespero quando aumenta a freqüência. E eu não sei dizer se foram horas ou minutos daquele jeito. Pedi para deitar de novo. Me avisaram que deitada a dor piora, mas eu não queria saber, estava cansada. Meu corpo todo tremia. Combinamos que eu deitaria por 10 minutos e depois voltaria a caminhar na sala, sentar na bola, fazer os exercícios pra facilitar. Rá!! Não fiz nada disso. Deitei, e 10 minutos depois elas falaram pra irmos para a sala, caminhar. Eu não quis. Pra ir pra bola. Eu não quis. Pra ir pro chuveiro. Opa! Chuveiro. Em algum ponto da minha consciência lembrei que chuveiro era bom. Falei: “Chuveiro. Chuveiro é bom.” E levantei cambaleando para ir pro chuveiro. Que horas eram? Há quanto tempo eu estava ali? Não fazia a menor idéia. Um pensamento fixo: Chuveiro é bom. Sentei no vaso antes, fazer xixi. E saiu o tampão. Sei que ligaram pro Dr. Fred nessa hora. Falaram que ele estava vindo. Sentei na banqueta de parto, debaixo do chuveiro. E, umas poucas contrações depois senti uma coisa estranha... “Clarissa!! Estou com vontade de fazer força!!” Acho que assustei todo mundo na hora. “Vamos sair do chuveiro então.” “Daqui eu não saio! Quero fazer força agora!” “Então faz.” E a consciência voltou por um intervalo curto. E vi Allan agachado na minha frente, me segurando as mãos. E eu disse: “Mas o Dr. Fred ainda não chegou.” Como é que eu ia fazer força se ele não estava lá, pensei. “Estou com medo.” “Não precisa ter medo. Ele já está chegando.” Foi a minha passagem de ida. Fiz uma força comprida. Dilatação? Nem sei o que é isso... Lembram? Quatro horas antes estava com 0 de dilatação e agora com essa vontade louca de fazer força? Escutei um “pop”. Parecia uma bola de sabão estourando lá embaixo. Era a bolsa. Em seguida senti a cabecinha dela “coroando”, Allan colocou a mão e eu disse “Tira!”. Sei lá... Deu medo... Daí, em algum momento depois disso ele trocou de lugar com a Clarissa. Lembrei da Rafaela falando pra “soprar a vela”. Que era assim... Respirar fundo, soltar o ar, e depois soprar uma vela. Ela tinha me falado disso na véspera. E tinha dito que não queria me ver fazendo “força de cocô”... Fiz outra força grande... Soprei a vela, fiz força de cocô, tudo meio junto. E a Clarissa falando: “Faz força devagar, senão vai lacerar.” Lacerar? Eu não tava nem aí. Lacerar é o caramba, que se dane, vou fazer a força que eu quiser! E saiu a cabecinha, parecendo um sabão. Mais uma força e veio o corpinho. Ouvi o choro, olhei, colocaram aquela coisinha suja de sangue, molhada, linda, nos meus braços... Olhei pra Clarissa e falei: “Clarissa, eu consegui...” E todo mundo no banheiro ficou em polvorosa. Aí eu ouvi um “cataplof!” e era a placenta, caindo inteirinha no chão, sem fazer força nem nada. Perguntei as horas. Ninguém tinha se lembrado de olhar... Eram 16:55. Daí calcularam rápido em 16:45, mas o Allan falou: “Mas não tem 10 minutos!!” e combinamos que tinha nascido às 16:50. Hora de ir pro quarto me deitar. Desmaiei. Exaustão, cansaço, perda de sangue, pressão baixa, hipoglicemia, tudo junto. Me reanimaram, Perguntei pela Catarina. Estava nos meus braços. Segura. Tentei de novo, outro desmaio. Me reanimaram de novo. Insisti em continuar. Um terceiro desmaio, já no meu quarto, no pé da cama. Catarina estava na bacia, junto com a placenta nessa hora. Não me deixaram levantar, o Dr. Fred tinha chegado. Clarissa ficou com Catarina nessa hora, aproveitou pra limpá-la, enquanto Allan e Fred me colocavam na cama. Bateu um desespero, pedi minha filha, me entregaram. Eu juro que achei que ia morrer. Os desmaios me assustaram mais que todo o resto. O Dr. Fred examinou a pequena, cortou o cordão. Ninguém lembrou que Allan queria cortar o cordão, nem mesmo ele! Estava tudo bem com ela e comigo. Ele examinou o períneo, uma laceração de segundo grau, 4 pontos. Menos que uma episio! Rá! Peso? Uns 3,200, chutado. Altura? Medimos hoje de manhã com uma fita métrica... 49 cm. APGAR? 10 aos 5 minutos (o Dr. Fred disse hoje de manhã... Ele voltou aqui para nos ver.) Dores? Pra sentar, um pouco... Os pontos beliscam. Dor nas costas, nas pernas, típicas de esforço físico, especialmente pra quem é sedentária. Tomei banho sozinha hoje de manhã. Consigo andar, sentar, levantar, deitar... Tudo meio dolorido, o útero está contraindo e dói também. E isso são as primeiras 24 horas. Minha princesa nasceu bem, com dez dedinhos nas mãos, dez dedinhos nos pés, na casa dela. Não foi pra berçário, UTI, incubadora. Veio para os meus braços. Não pingaram nitrato de prata nos seus olhos. Não deram injeção de vitamina K. Muito menos soro glicosado ou leite artificial. Tem um pulmão fortíssimo, chora bem alto. Tem uma pegada no peito que só lembro do Rafa com três meses pegando parecido. Suga forte. Meu colostro desceu hoje e o leite deve estar a caminho. Estou feliz! Demorei para dormir ontem pela euforia que tomava conta da minha mente, apesar do corpo cansado. Minha mãe (que chegou depois de tudo terminado, ela foi buscar o Rafa na creche para nós) olhou para mim, num momento que ficamos a sós e me disse: “Eu achei que você não ia conseguir.” Com um sorriso no olhar como que dizendo o quanto ela estava feliz por mim. Eu respondi: “Eu também achei que não.” "

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